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Daniel Borges e o caminho até o II Brasileiro de Parajiu-Jitsu

Daniel em uma de suas palestras. Foto: Reprodução

Uma das características que torna o Jiu-Jitsu tão efetivo é sua capacidade de se adaptar às diferenças de seus praticantes. Foi este aspecto que levou nosso GMI Daniel Borges a se apaixonar pelo esporte e fundar a Federação Catarinense de Jiu-Jitsu Paradesportivo, ou FCJJP. Através da organização e seus parceiros, Daniel seguiu em sua missão de trazer visibilidade aos paratletas e, em agosto, realizará o II Brasileiro de Parajiu-Jitsu.

Em papo com GRACIEMAG, Daniel falou sobre os desafios de organizar um evento deste porte, os diferenciais que este oferecerá a seus participantes e ainda contou sobre sua trajetória até fundar a FCJJP. Confira nas linhas abaixo!

* Entre para o time GMI! *

GRACIEMAG: Como conheceu o Jiu-Jitsu?

DANIEL BORGES: Aos 30 anos de idade, estava sobrepeso e com uma diferença grande de tamanho nos ombros, então me matriculei em uma academia, com o intuito de melhorar a minha qualidade de vida. Em uma das sessões de musculação, vi uns caras passando com kimono embaixo do braço e resolvi ir atrás para descobrir onde estavam indo. Me deparei com um treino de competição rolando no subsolo da academia e fui convidado pelo professor a participar. Topei e, desde então, não parei mais.

Já havia tido alguma experiência com esportes?

Pratico esportes desde muito jovem, graças ao meu pai. Desde natação e tênis até judô e boxe, esse contato que eu tive com o mundo desportivo foi fundamental para que eu passasse a infância e adolescência sem sofrer qualquer tipo de bullying ou rejeição, situações já comuns para pessoas com deficiência nesta faixa etária. Conforme fui crescendo, me afastei do esporte e passei a priorizar outras coisas, como meu trabalho e meu casamento, mas me senti revigorado quando entrei pro Jiu-Jitsu.

Daniel recebendo a faixa-roxa. Foto: Reprodução

Com toda sua experiência na esfera desportiva, qual foi o diferencial que te conquistou no Jiu-Jitsu?

Sem desmerecer os outros esportes, mas o Jiu-Jitsu é incrível. Em sua essência, ele é um esporte sobre adaptação. Os praticantes tem diversos biotipos físicos e todos podem ser eficientes se a pessoa souber usar aquilo a seu favor. Essa foi a primeira coisa que eu percebi quando comecei a treinar, entendi que poderia usar o meu corpo e a minha deficiência como um benefício, um trunfo para ser ainda mais eficiente nos tatames. Com o passar dos anos, essa ideia foi se confirmando e eu vi o quão perigoso meu jogo poderia ser para os meus adversários.

Em 2017, você se inseriu no cenário do Parajiu-Jitsu e deu início a uma sequência de três títulos mundiais em Abu Dhabi. De onde surgiu esse gosto pela competição?

Depois de três anos na branca, eu precisei me mudar para Goiânia, por conta do trabalho. Até então, eu malhava e treinava Jiu-Jitsu, mas não acreditava que conseguiria competir ou que teria uma boa atuação nos campeonatos. Em Goiânia, ingressei em uma academia e o professor de lá disse que eu tinha bons resultados nos treinos e que deveria competir. Fiquei meio receoso e, devido a morte do meu pai, acabei me afastando da academia. Pouco tempo depois, minha esposa me incentivou a voltar e o professor falou que só me treinaria se eu competisse. Acabei cedendo e, em 2014, bati três adversários e fui campeão de um torneio local. Meu único arrependimento foi só ter competido depois que o meu pai morreu, mas pensar nele me motivou a continuar competindo e melhorando no esporte.

Você mencionou que a síntese do Jiu-Jitsu é a adaptação. Como você adaptou a sua deficiência ao seu jogo de Jiu-Jitsu?

Eu tenho agenesia de membro superior do lado esquerdo, então meu braço é mais curto e o cotovelo dobra ao contrário. Desta forma, armlock não funciona deste lado do meu corpo. Se meu oponente tentar um armlock desse lado, ele não consegue me finalizar e eu consigo alcançar o cem quilos, já iniciando um contra-ataque. Eu aprendi a usar a minha deficiência a meu favor, mas isso foi graças ao meu professor da faixa-azul, que dedicou tempo para me ajudar a desenvolver estratégias que fossem compatíveis comigo. O fato do meu braço ter uma alavanca mais curta me permite mais pressão e força em alguns ajustes. No cem quilos, eu encaixo o meu braço abaixo da axila do meu oponente e ele não consegue tirar aquele braço. Esse é um dos pontos mais interessantes do Jiu-Jitsu, todas as deficiências possuem uma forma de adaptação.

Daniel junto a outros paratletas. Foto: Reprodução

Na sua opinião, qual é o maior desafio que um portador de deficiência encara ao ingressar em um esporte?

Hoje, com todos os anos que eu tenho de experiência em âmbito esportivo, posso afirmar que é a família. Eu tive a sorte de ter uma família que me levou pro esporte e que o via como um vetor para a minha inserção na sociedade, mas existem famílias que, por medo, impedem que o deficiente treine ou se exponha diante da sociedade. Pessoas com deficiência atualmente compõem mais de 20% da população brasileira, mas nós não vemos essas pessoas em academias ou até mesmo passeando na rua. Isto se dá porque a família sente medo e esse sentimento acaba alcançando o deficiente. Por isso, nós almejamos esse público com o intuito de mostrar os benefícios do Jiu-Jitsu, como ele inspira a eficiência e que, com o passar do tempo, traz confiança e auto-estima para seus praticantes.

Em que ponto da sua trajetória você passou a idealizar a FCJJP?

Em 2019, antes de ir disputar o meu último mundial em Abu Dhabi, surgiu a ideia de procurar o governo do estado de Santa Catarina para pedir patrocínio. Na época, o presidente da Fundação Catarinense de Esporte era lutador de Jiu-Jitsu, mas nunca havia ouvido falar sobre o Parajiu-Jitsu. Quando soube que eu já havia sido campeão mundial e viajado para vários lugares para competir, ele deu a ideia de fazermos um torneio em Santa Catarina. Com esse apoio, conseguimos realizar o primeiro brasileiro de Parajiu-Jitsu. Pouco tempo depois, eu fui campeão novamente e saí do cenário competitivo para focar na gestão dessa organização que, ainda em 2019, ampliaria seu escopo de atuação, investiria em ONGs e projetos sociais, para se tornar a FCJJP.

Como se deu a parceria entre a FCJJP e a SJJSAF?

No nosso primeiro ano, a FCJJP divulgou um material que continha o manual de regras da federação. Na confecção, levamos em conta critérios olímpicos, classificações funcionais científicas e outros detalhes importantes para o bom andamento de uma competição de Parajiu-Jitsu. O presidente da SJJSAF Cleiber Maia, que já defendia a inclusão no esporte, se interessou pelo material e me chamou para participar de um campeonato da federação dele, para que eu visse como funcionava e discutisse uma possível parceria. Como nossos valores e objetivos para o Parajiu-Jitsu estavam alinhados, a parceria foi feita e passamos a promover competições de alto nível competitivo no Parajiu-Jitsu. Hoje, às vésperas do II Brasileiro de Parajiu-Jitsu, eu só tenho a agradecer ao Cleiber, que nos acolheu e é um dos responsáveis por esse sonho se tornar realidade.

Evento ocorre no dia 8 de agosto, na Arena da Juventude, no bairro carioca de Deodoro. Foto: Reprodução

Falando no Brasileiro de Parajiu-Jitsu, quais são suas expectativas para este evento?

Estou muito feliz com este projeto, ele representa a continuação de um sonho que começou em 2019 e que se tornará realidade em breve. Trata-se de um campeonato de Parajiu-Jitsu acontecendo em conjunto com um torneio de Jiu-Jitsu, que é o Brasil Open 2021 da SJJSAF, e com a estrutura de competições grandes, que atraem inúmeros fãs do esporte. Queremos que os paratletas tenham orgulho de dizer que competem e que tenham a exposição profissional que merecem, com imagens e vídeos de alta qualidade. Nossa intenção é que esses participantes se sintam como os ídolos que são, pois esse é o momento deles.

Além do GP e das lutas casadas, qual é o diferencial que o II Brasileiro de Parajiu-Jitsu trará aos tatames competitivos de Deodoro?

Além das divisões normais de competição, como faixa e peso, nós juntamos os atletas dos absolutos de acordo com seus grupos motores. Desta forma, um deficiente visual, por exemplo, lutará com outros que tenham esta mesma condição para conquistar o título absoluto. Somando todos os grupos de deficientes, teremos quatro absolutos em andamento na competição. A partir desta dinâmica, desenvolvemos um novo GP, chamado “Rei do Tatame”. Depois que forem definidos os campeões absolutos de cada grupo motor, esses paratletas irão duelar entre si para definir quem é o melhor e o vencedor será premiado com anel único e personalizado para celebrar seu triunfo.

Após a competição, quais são os próximos planos para a FCJJP?

Na nossa federação, reconhecemos que as pessoas com deficiência têm muito para ensinar a todos. Com isto em mente, estamos com um projeto para levar professores e outros profissionais do Jiu-Jitsu que tenham deficiência para fora do país. Este projeto ainda está em fase de planejamento, mas teremos mais informações para compartilhar com o público em breve. Planejamos colocar essa iniciativa em andamento no fim deste ano ou no início do próximo. O objetivo é mostrar a todos que os profissionais deficientes são tão comerciais quanto os sem deficiência e que este é um mercado amplo a ser explorado.

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